VEM COMIGO?
No post anterior, onde falo da origem da minha paixão musical a partir do primeiro êxtase, o texto se encerra no preciso momento em que eu mudava de professora e buscava orientação mais profissional. Afinal, meu interesse pela Música tomava proporções realmente “assustadoras”. E é sobre isso que escrevo agora.
UMA NOVA MESTRA PARA UMA NOVA FASE
No início de 1990, um ano e meio depois de minha primeira aula, fui até o Conservatório Brasileiro de Música para conhecer minha nova professora, Maria Tereza Soares. Ela é, até hoje, uma das melhores professoras de piano do Rio de Janeiro. Eu podia prever que uma época cheia de possibilidade estava bem diante de mim!
Nossa relação professora-aluno era maravilhosa e tínhamos uma sintonia tremenda. Sob seu rigoroso olhar estudei ainda mais que antes e tive uma evolução imensa entre 1990 e 1991. São dessa época minhas primeiras experiências em competições de piano em nível nacional.
Eu vinha carregando comigo desde sempre esse encantamento pela criação musical. Tinha esse sonho quase infantil de um dia poder tocar minhas composições nos grandes palcos da Europa e ser valorizado e reconhecido como compositor. Soava até meio ingênuo, né?
A verdade é que à medida que fui crescendo e, digamos assim, “botando os pés no chão”, esse sonho cada vez mais parecia inalcançável e fora da realidade. Meu interesse foi naturalmente migrando para o trabalho de intérprete, onde acreditava que poderia de fato ir mais longe.
COM APOIO TUDO FICA MAIS FÁCIL
O ano de 1992 chegou abrindo portas. Eu tinha então 16 anos. A direção do CBM (Conservatório Brasileiro de Música) foi procurada pelo Montrealbank, que pretendia investir na formação de um jovem estudante de música. Alguns alunos foram selecionados para participar do “concurso” e, algumas horas depois, foi anunciado que o escolhido tinha sido eu!
A bolsa de estudos oferecida pelo banco era um sonho: nunca mais gastaria um centavo sequer com mensalidades, nem com afinações do meu piano e nem mesmo na compra de partituras, aqueles gordos livros com sonatas de Beethoven ou estudos de Chopin.
E mais: minha contrapartida como bolsista era estar sempre disponível para representar o Conservatório em situações diversas. Era mais ou menos assim: “temos que enviar alguém para fazer a inauguração de uma escola de música lá na Bahia. Ora, chamem o bolsista!”. Acontece que essa “obrigação” era o maior benefício de todos! É o famoso ganha-ganha.
Por conta disso me apresentei muito neste período e praticamente deixei a criação musical de lado. Meu objetivo principal era me tornar um pianista! Suei a camisa, criei calos nos dedos e alcei os voos que me cabiam.
Aos 17, terminei o Ensino Médio e chegou a hora de escolher uma faculdade. Nesta mesma época o Montrealbank resolveu cancelar sua parceria com o CBM. Por um momento fiquei na dúvida: como seria o meu futuro?
ALTITUDE DE CRUZEIRO…
Não, não foi preciso deixar a instituição que me recebeu de braços abertos e que sempre cuidou de minha formação tão cuidadosamente. Com o generoso apoio da diretoria do Conservatório Brasileiro de Música – através das incríveis Cecilia Conde e Marina Lorenzo Fernandes – me foi feito o convite para continuar na casa e lá realizar minha graduação em piano. A bolsa de estudos seria bancada pelo próprio CBM, incluindo as afinações, partituras e tudo mais, exatamente como sempre foi!
Durante o curso, fiz amigos, viajei, dei muitos recitais, cultivei uma relação quase de família com minha mestra Maria Tereza, cresci pessoal e profissionalmente. Como tem que ser, voando alto.
E SURGE O SEGUNDO MESTRE
No início da faculdade, em 1995, conheci meu segundo grande mestre: Luiz Carlos de Moura Castro, uma pessoa iluminada com o dom de fazer e ensinar música. Ele vivia nos Estados Unidos, em Hartford (Connecticut), mas vinha ao Brasil pelo menos duas vezes ao ano para ministrar masterclasses de alto nível e também para dar concertos. Tocava e lecionava no mundo todo, aliás. Um verdadeiro mentor global.
Criamos uma relação de grande amizade e respeito. Lembro do meu encanto ao ouvi-lo tocar São Francisco Caminhando Sobre as Ondas, de Liszt, uma peça quase celestial que pode facilmente perder sua beleza por conta de sua difícil execução. Foi na Sala Cecilia Meireles, durante o I Festival Liszt do Rio de Janeiro. Monumental. Virei um fã!
Tocando no Festival Liszt (1995)
Vejam bem, nunca deixei de ser aluno da Maria Tereza e ao longo da faculdade fui recebendo essa carga dupla de informação e influência até minha formatura, em 1998. Foi uma oportunidade e tanto ter vivido isso assim dessa forma e a aproveitei o máximo que pude.
O FUTURO E OS PRIMEIROS PASSOS COMO PROFESSOR
Pouco antes de me formar comecei a dar aulas de piano. Precisava analisar minhas alternativas para o futuro. Para muitos músicos, às vezes é inevitável considerar a possibilidade de uma atividade pedagógica tão ou mais intensa que a de performance. O prazer de ensinar foi uma grande descoberta na minha vida. É algo que faço com extremo prazer até hoje, inclusive.
Neste contexto fui aos poucos fazendo planos com o Moura Castro de fazer mestrado nos Estados Unidos e me tornar seu aluno em tempo integral, tendo o privilégio de completar minha pós-graduação numa instituição forte como a Hartt School of Music, divisão de música da Hartford University.
Logo depois de minha formatura no Conservatório Brasileiro de Música, coroando o maravilhoso trabalho com minha querida mestra, fui para Hartford fazer a prova de admissão. Uma experiência e tanto! Fui aprovado e ganhei uma bolsa de estudos oferecida pela própria Hartt School!
Meu trabalho a seguir era conseguir o apoio final do governo brasileiro e fiz uma prova para obter a desejada bolsa de estudos da CAPES. Outra vez, fui aprovado! E, num desses luminosos momentos da vida, me preparei para a grande viagem.
MESTRADO NOS ESTADOS UNIDOS! #SóQueNão
A viagem estava marcada para o dia 29 de agosto de 1999. Já estava de malas prontas quando me chega a notícia-balde-de-água-fria: o governo Fernando Henrique Cardoso tinha cortado quase todas as bolsas de estudo naquele ano, inclusive a minha. Faltando apenas um mês para a partida descobri que não iria mais.
(pausa para remoer frustrações da vida)
Eu tinha me preparado ao máximo, estava no meu ápice como pianista, e esta decepção teve um impacto fulminante.
Não é questão de não saber lidar com fracassos. Ao se trabalhar com alta performance, seja em que campo for, o fracasso faz parte do processo. A falha, o erro, é fundamental para se crescer. Já fui eliminado em um concurso de piano, já fiz más apresentações, já me desiludi e me decepcionei com situações e pessoas diversas, mas tudo isso normalmente só fortalece nossa determinação. Não dessa vez.
DESILUSÃO FATAL
Dessa vez algo se quebrou. Anos de entrega quase absoluta e eis que, aos 24 anos, me faltou firmeza nas pernas e caí.
O ano 2000 chegou e, junto com o Bug do Milênio, deu erro na minha Arte.
A vida é um espectro vasto de emoções, luz e sombra, êxtase e desencanto, parece uma obra de Beethoven. Viver tudo isso na pele de um artista é uma experiência dolorosa, é preciso dizer.
No entanto, eu não fazia ideia do que ainda estava por vir.
Logo ali adiante…
(Pequena Autobiografia, parte 2 de 5)
* * *
E eis a segunda parte da minha odisséia como estudante, pianista e amante da Música durante os anos 90, período da minha formação. Torço para que você tenha gostado e aguardo seu retorno aqui para ler a terceira parte desta pequena autobiografia, combinado?
Se você não leu a primeira parte desta história, não deixe de conferir o artigo O Primeiro Êxtase.
Adoraria se você deixasse um comentário dizendo se curtiu o texto ou, melhor ainda, dizendo se na sua formação também viveu alguma decepção que tenha sido capaz de mudar sua trajetória. Quando tudo parecia tomar um certo caminho, pronto: de repente uma nuvenzinha preta paira sobre nossas cabeças e faz com que a gente pare para repensar um pouco o caminho a seguir.
Respondo todos os comentários, viu? Será um prazer ler você aqui.
Até a próxima postagem!
Luiz